Narada
Muni é o mestre dos mestres e dos semideuses
de todo o universo e costuma viajar de planeta
em planeta, de mundo em mundo e de uma dimensão
a outra, ora tocando refinados acordes em
sua harpa Vina para acompanhar sua meditação
nas glórias e nos nomes de Deus, ora
contando histórias sobre as glórias
infinitas do Senhor Supremo, trazendo, desse
modo, luz ao coração de todos
que o ouvem.
Os
semideuses e sábios situados no mundo
sutil e subjetivo são capazes de observar
tudo que acontece neste mundo físico,
apenas sintonizando sua mente. Desde o mundo
subjetivo, Narada pôde observar o que
acontecera a Dhruva. Ficou muito admirado
de perceber a natureza nobre e determinada
do menino e pensou que seria melhor convencê-lo
a desistir da idéia. Com essa idéia
em mente, o mestre sintonizou sua consciência
na floresta em que Dhruva se encontrava.
O
príncipe meditava em ioga, sentado
de pernas cruzadas sobre a relva com a coluna
ereta. Tinha os olhos semicerrados, mantinha
a atenção concentrada no ponto
entre as sobrancelhas e controlava sua respiração.
Ainda
que seu corpo seja espiritual e imperceptível
aos olhos físicos, Narada usou seus
poderes místicos e tornou-se visível
neste mundo material.
Narada
ficou distante por um momento, observando
os traços fortes do menino e sua
feição pacífica e determinada.
Logo, tornou sua presença mais forte,
o que fez com que Dhruva abrisse os olhos,
forçado a voltar de sua meditação
para o mundo externo.
O
príncipe reconheceu o mestre espiritual
de toda sua família e, depois de reverenciá-lo
de modo apropriado, ofereceu-lhe um assento.
O
grande sábio Narada, compreendendo
as atividades de Dhruva Maharaj, estava atônito.
Aproximou-se do príncipe, e tocando
a cabeça do menino com sua mão
virtuosa, pensou consigo mesmo: "Quão
maravilhosos são os poderosos guerreiros
xátrias. Não podem tolerar a
menor infração a seu prestígio.
Imaginem só! Mesmo sendo apenas uma
criança, Dhruva não conseguiu
tolerar as palavras rudes de sua madrasta."
O grande sábio Narada voltou-se para
o príncipe menino e disse:
"Príncipe,
você é apenas uma criancinha
apegada a brincadeiras e a outras frivolidades.
Por que se sente tão afetado por palavras
que insultam sua honra? Meu querido Dhruva,
se você sente que seu sentido de honra
foi insultado, mesmo assim não tem
razão para sentir-se insatisfeito.
Esse tipo de insatisfação é
outra característica da energia ilusória,
pois toda entidade viva é controlada
por suas ações anteriores, e
é por isso que existem vários
tipos de vida, seja para desfrutar ou para
sofrer.
"O
processo de devoção pessoal
ao Deus Supremo é muito maravilhoso.
A pessoa que é inteligente deveria
aceitar esse processo e ficar satisfeito com
o que receber por Sua vontade suprema, seja
isso favorável ou desfavorável.
Agora, apenas para obter a misericórdia
do Senhor, você decidiu adotar o processo
da meditação mística,
seguindo a instrução que sua
mãe lhe deu. Mas, penso que tais austeridades
são impossíveis de serem praticadas
por um ser humano comum. É muito difícil
satisfazer a pessoa de Deus.
"Depois
de praticar este processo por muitos e muitos
nascimentos e permanecendo desapegados da
contaminação material, situando-se
em transe e executando muitos tipos de austeridades,
vários iogues místicos foram
incapazes de encontrar um fim para o caminho
da realização de Deus. É
por isso, meu querido pequeno príncipe,
que você deveria interromper seus esforços
nessa direção, pois dificilmente
terá êxito. É melhor que
volte para casa. Quando crescer, e se receber
a misericórdia do Senhor, terá
oportunidade de realizar estas atividades
místicas. Nesse momento, poderá
envolver-se nessa tarefa.
"A
pessoa deveria procurar ficar satisfeita com
qualquer condição que a vida
lhe ofereça —seja de felicidade
ou de sofrimento— e que resulta da vontade
suprema. A pessoa que se esforça desta
forma é capaz de atravessar a escuridão
da ignorância com muita facilidade e
jamais será afetada pelas misérias
triplas deste mundo material."
O
príncipe Dhruva ouviu a tudo com atenção.
Não estava satisfeito com a tentativa
do mestre de demovê-lo de seu intento
de encontrar-se com Deus para pedir-lhe pessoalmente
que satisfizesse seu desejo. Com as mãos
juntas em respeito pelo mestre, disse:
"Meu
querido mestre Narada, o senhor é aclamado
como o mais sábio de todos os sábios
do universo, o mestre dos mestres, o abrigo
único para as pessoas em busca da iluminação
espiritual. Para que alguém como eu,
perturbado pelas condições materiais
da felicidade e do sofrimento, possa alcançar
a paz mental, tudo que o senhor explicou por
sua bondade é certamente uma instrução
excelente. Mas, no que me diz respeito, encontro-me
atualmente coberto pela ignorância,
e seus ensinamentos não comovem meu
coração.
"Ó
mestre, sou muito imprudente ao não
ser capaz de aceitar suas instruções.
Mas veja que nasci numa família de
santos guerreiros da casta dos xátrias
e que são muito determinados em seus
objetivos. Minha madrasta, Suruchi, trespassou
meu coração com suas palavras
impiedosas. Portanto, sua instrução
valiosa não é capaz de comover
meu coração endurecido.
"Ó
brâmane erudito, desejo ocupar uma posição
que seja tão exaltada como jamais foi
alcançada por qualquer outra pessoa
nos três mundos, nem mesmo por meu pai
e avôs. Seja generoso comigo. Mostre-me
um caminho honesto que me permita atingir
meu objetivo de vida. Meu querido mestre de
minha alma, o senhor é o valioso filho
de meu bisavô, o Senhor Brahma, e o
senhor viaja, tocando seu instrumento de cordas,
a Vina, para benefíciar todos os seres
vivos do universo. O senhor é como
um sol brilhante que gira pelo universo iluminando
os seres vivos para seu máximo benefício."
O
mestre Narada Muni, ao ouvir as palavras do
príncipe, ficou tomado de compaixão,
e mostrou sua misericórdia sem causa,
aconselhando-o da seguinte maneira:
"A
instrução de sua mãe
de seguir o caminho do serviço devocional
à Pessoa de Deus é muito apropriada
para o que você pretende. Portanto,
envolva-se completamente na prática
do serviço devocional ao Senhor. Quem
deseja obter os frutos dos quatro objetivos
principais –religiosidade, desenvolvimento
econômico, prazer dos sentidos e liberação–
deve ocupar-se no serviço devocional
à Personalidade Suprema de Deus.
"Meu
querido menino, você deve dirigir-se
para as margens do Rio Yamuna, onde encontrará
a floresta de Madhuvana e onde deverá
purificar-se. Somente por visitar esta floresta,
a pessoa aproxima-se mais da Pessoa de Deus,
que anda sempre por lá em pessoa. Banhe-se
três vezes ao dia no Rio Yamuna, pois
suas águas são muito auspiciosas,
sagradas e puras. Depois do banho, pratique
os exercícios de Ashtanga-ioga e, em
seguida, sente-se em seu assana numa posição
que lhe permita ficar calmo e imóvel.
Pratique os três tipos de exercícios
respiratórios e controle gradulamente
o ar vital, a mente e os sentidos. Liberte-se
completamente de toda contaminação
material e, com paciência, comece a
meditar na Suprema Personalidade de Deus."
Depois
de instruir o príncipe dessa forma
e ensinar-lhe o processo iogue de pranayama
para controle da respiração,
Narada começou a descrever, com detalhes,
o conhecimento mais oculto e o maior de todos
os segredos: a forma pessoal do Senhor e o
objeto mais elevado de toda meditação.
"O
rosto de Deus é sempre muito belo de
se ver e exibe uma expressão agradável.
Para os devotos que O vêem, Ele parece
jamais estar insatisfeito e sempre pronto
a dar-lhes Suas bênçãos.
Seus olhos, Suas lindas e decoradas sobrancelhas,
Seu nariz arrebitado e Sua ampla testa formam
um conjunto estético onde culmina toda
a beleza. Se fosse possível somar a
beleza de todos os semideuses e dos anjos
dos céus, ainda assim, Ele permaneceria
comparativamente o mais belo de todos. A forma
de Deus permanece sempre jovem. Cada membro
e ângulo de Seu corpo mantêm proporções
harmoniosas e estão livre dos defeitos
materiais. Seus olhos e lábios são
rosados como o sol nascente. Ele está
sempre pronto a dar abrigo às almas
entregues, e a pessoa que for afortunada ao
ponto de poder vê-lO ficará plenamente
satisfeita.
"O
Senhor Supremo é um oceano de misericórdia,
o que O qualifica a ser o mestre da alma que
a Ele se rende. O Senhor Supremo traz em seu
peito a marca de Srivatsa, que é o
local onde repousa a deusa da fortuna. Seu
corpo tem um matiz azul profundo. O Senhor
é eternamente uma pessoa. Ele usa uma
guirlanda de flores em volta ao pescoço
que balança sobre Seu peito nu. Em
Sua forma de Vishnu, Vasudeva, ou Narayana,
Ele manifesta quatro braços que seguram
(de Sua esquerda para a direita) um búzio,
um disco, uma maça e uma flor de lótus.
Ele usa um elmo de ouro decorado com pedras
preciosas, colares e braceletes, e Seu peito
é enfeitado pelo colar Kaustubha. Veste-Se
com roupas de seda amarela. A cintura do Senhor
e Seus pés de lótus são
decorados por correntes com pequenos sinos
de ouro. Seus traços são muito
atraentes e oferecem a perfeição
aos olhos que O vêem. Ele é sempre
pacífico, calmo e muito agradável
para os olhos e a mente.
"Os
iogues autênticos meditam nessa forma
transcendental de Deus situado de pé
sobre a flor de lótus de seu coração.
Deus está sempre sorrindo com seus
dentes alvos parecidos a brotos de jasmim,
e Suas unhas de lótus são como
jóias reluzentes. O devoto deve constantemente
ver que nesta Sua forma transcendental Deus
está olhando para ele com muita misericórdia.
Ao fazer isso, o meditador profundo deve focar
sua mente na Personalidade de Deus que concede
todas as bênçãos. A pessoa
que medita dessa maneira, concentrando sua
mente na forma sempre auspiciosa do Senhor,
em muito pouco tempo fica livre de toda contaminação
material e nunca decai de sua meditação
na Personalidade de Deus.
"Príncipe
Dhruva, ouça atentamente o mântra
sagrado que deverá cantar enquanto
pratica o processo de meditação
que lhe ensinei. A pessoa que cantar este
mântra cuidadosamente durante sete noites
chegará a ver os seres humanos aperfeiçoados
voando pelo céu. Om namô
bhagavatê vasudevayá: este
mântra de doze sílabas é
utilizado para adorar ao Senhor Krishna, o
filho de Vasudeva e a forma suprema do Infinito
e Absoluto Deus. Para praticar este processo
devocional, a pessoa deve instalar a forma
da Deidade do Senhor sobre um altar. Enquanto
canta o mântra, deve oferecer a essa
Deidade flores e frutas e outras variedades
de alimentos vegetarianos, seguindo com precisão
todas as regras prescritas pelas autoridades
espirituais. Mas isso deve ser feito levando
em consideração o lugar, o tempo
e as circunstâncias favoráveis
ou não.
"A
pessoa deve adorar o Senhor oferecendo água
pura, guirlandas de flores, frutas, flores
e vegetais, que se encontram disponíveis
na floresta, ou coletando gramas novas, pequenos
brotos de flores ou até mesmo cascas
de árvores e, se possível, oferecendo
folhas de Tulasi, que são muito amadas
por Krishna. A forma pessoal do Senhor pode
ser modelada em elementos físicos tais
como terra e água, polpa, madeira ou
metal. Na floresta, essa forma transcendental
pode ser modelada com nada mais do que terra
e água e adorá-la conforme os
princípios acima descritos.
"O
devoto capaz de controlar totalmente seu ser
deve ser muito sóbrio e pacífico
e deve sentir-se satisfeito simplesmente comendo
quaisquer frutos ou vegetais que encontre
na floresta. Meu querido Dhruva, além
de adorar a Deidade e de cantar o mântra
três vezes ao dia, você deve ainda
meditar nas atividades transcendentais da
Personalidade Suprema de Deus em Suas diferentes
encarnações, que se manifestam
por Sua vontade suprema e potências
pessoais. A pessoa deve seguir o exemplo dos
devotos anteriores no que se refere ao modo
de adorar o Senhor Supremo com a parafernália
prescrita. Ou pode oferecer adoração
em seu coração recitando o mântra
para a Personalidade de Deus, pois Ele é
idêntico ao som do mântra.
"Qualquer
pessoa que ocupar sua mente, suas palavras
e seu corpo no serviço devocional ao
Senhor com seriedade, sinceridade e permanecer
fixo nas atividades dos métodos devocionais
prescritos pelo mestre espiritual e pelas
escrituras sagradas, tem seu desejo abençoado
pelo Senhor. O devoto será recompensado
com o que desejar, seja desenvolvimento econômico,
prazer dos sentidos ou liberação
do mundo material. Se a pessoa for sincera
a respeito de seus objetivos, deverá
apegar-se ao processo do serviço amoroso
transcendental, ocupando-se vinte e quatro
horas ao dia experimentando o mais alto nível
de êxtase devocional."
Depois
de ouvir atentamente os conselhos detalhados
do mestre espiritual e aprender na prática
o processo da devoção ao Senhor
Surpemo, Dhruva circundou Narada e ofereceu-lhe
suas reverências respeitosas. Após
despedir-se do mestre, o menino príncipe
iniciou sua jornada rumo a Madhuvana, a floresta
sagrada que é sempre decorada pelas
pegadas de lótus do Senhor Krishna
e que, por conseguinte, é especialmente
auspiciosa.